segunda-feira, 12 de agosto de 2013

 

Artigo: Do discurso à prática

(A) Ao passar pelo Brasil para a Jornada Mundial da Juventude, o papa Francisco surpreendeu aqueles que, assim como eu, pouco ou quase nada sabiam a seu respeito, pela sua simplicidade e humildade. Esses hábitos não são de hoje, não são de faz de conta, não são para mostrar o que não é. O Santo Padre age em consonância com o que diz. De hábitos simples, andava de transporte público quando era cardeal na Argentina e hoje mora na Casa Santa Marta, onde moram outros membros da Igreja Católica.

Anos atrás, Joaquim Barbosa, ministro do Supremo Tribunal Federal, ganhou milhares de fãs no Brasil inteiro ao enfrentar o então polêmico presidente da Casa, ministro Gilmar Mendes, e dizer-lhe em uma discussão: “Vossa Excelência está destruindo a Justiça deste país e vem agora dar lição de moral em mim. Saia à rua, ministro Gilmar.” Quando jovens saíram às ruas de Mossoró protestando pela falta de ações na mobilidade urbana da cidade, pedindo obras e atitudes para melhorar as condições daqueles que utilizam transporte coletivo, a prefeita da cidade resolveu remanejar R$ 1.539.000,00 para propaganda, dos quais R$ 500.000,00 saíram justamente da Subsecretaria de Trânsito e Transporte, responsável por atender a principal demanda dos manifestantes.

O sistema de saúde do Rio Grande do Norte está um caos. Já foi notícia nos grandes jornais do país e a cada dia vemos uma situação mais degradante. Na semana retrasada, um juiz bloqueou os recursos públicos estaduais destinados à propaganda para que fossem usados na Saúde. Marcus Vinícius Pereira Júnior alegou que em 2011 a governadora gastou R$ 16 milhões em propaganda e investiu apenas R$ 11 milhões na saúde. O magistrado se assustaria mais se visse os gastos com publicidade do ano de 2012, que ficaram em R$ 26 milhões. Um empresário simula envio de produtos para o exterior somente para gerar crédito de importação e sonegar impostos, não paga direitos trabalhistas, passa por cima de diversas leis e depois vai para a imprensa cobrar honestidade dos governantes. Isso é coerência?

Em um ano que entrará para a história como quando aconteceram osmaiores protestos já registrados no país, uns parecem ter entendido orecado das ruas, outros nem tanto. A diferença entre o discurso e a prática é antiga, muito mais do que o dito popular “faça o que eu digo e não faça o que eu faço”. Apontar o dedo para o próximo parece mais fácil do que revisarmos nossos próprios defeitos e erros, seja na esfera política, seja na religião, no ramo empresarial ou até mesmo na família. Sair da retórica e entrar na prática parece ser impossível para algumas pessoas. Na gestão pública, há um complicador para pessoas que adotam estas práticas: a velocidade da informação e as redes sociais. As leis que obrigam que seja dada transparência municiam de informações todos aqueles que assim desejam e, mesmo que gestores tentem esconder, muitas informações chegam ao conhecimento da sociedade.

É bem verdade que há sociedades ignorando desmandos em nome do status quo, das benesses pessoais e vantagens oferecidas. Mais cedo ou mais tarde essa situação tende a acabar e talvez seja tarde. Como disse o papa Francisco, “um jovem que não protesta não me agrada”. Se a sociedade não se mobiliza, se as massas não defendem seus direitos, continuarão marginalizadas. Nos dias de hoje, todos se preocupam com manifestantes. O STF não quer prolongar o julgamento do Mensalão por temer ocupação da Praça dos Três Poderes por manifestantes, a prefeita de Mossoró e a governadora do RN têm andado cercada por claques para abafar possíveis vaias, alguns políticos pararam de utilizar-se de avião oficial para passeios, o Governo Federal voltou atrás de decisões tomadas sem negociação. Tudo isso fruto das manifestações ocorridas no país.

É importante que todos ouçam o que diz a voz rouca das ruas. Padres, juízes, políticos, médicos, estudantes, professores, empresários... Todos devemos ter nas nossas ações atos condizentes com o que pregamos. (Fonte: Jornal O Mossoroense de 11 de agosto de 2013).

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